A transição energética na área de transporte coletivo, por si só, não resolverá o problema das emissões de carbono do setor: é fundamental recuperar os passageiros perdidos para o transporte individual nos últimos anos. É o que apontaram especialistas durante a 9ª edição do Seminário Cidades Verdes, na capital fluminense. O evento multidisciplinar, realizado pelo Instituto Onda Azul em parceria com a Federação das Indústrias do Rio de Janeiro (FIRJAN), tem como tema "A Transição Energética e as Cidades" e reuniu debatedores em oito painéis, nesta terça e quarta-feira, no Centro de Convenções da FIRJAN, no Centro do Rio.
Na primeira mesa, sob o tema "Transportes sem emissões", Andrea Souza, coordenadora do Programa de Engenharia de Transportes da Coppe/UFRJ, chamou a atenção para a velocidade com que o mundo vêm assistindo às mudanças climáticas: "Estamos vendo o pior cenário previsto pelos cientistas, e numa velocidade que pode comprometer a nossa existência", diz a pesquisadora. Segundo ela, em 2022, o transporte de passageiros foi responsável por 47% das emissões de carbono do setor de transporte no país.
No entanto, de acordo com uma pesquisa da Confederação Nacional de Transporte divulgada em agosto, a demanda pelo ônibus têm caído vertiginosamente: em 2017, 45% dos brasileiros faziam seus deslocamentos por este modal, e já em 2024, apenas 30,9%. Enquanto isso, o número de cidadãos que usam o carro para transporte subiu de 22% para 29%, optando sobretudo pelo uso de aplicativos específicos. Estes números, diz Guilherme Wilson, gerente de Planejamento e Controle da Semove (Federação das Empresas de Mobilidade do Estado do Rio de Janeiro), revelam que a questão não se restringe apenas à eletrificação dos ônibus: "Não adianta ter ônibus elétrico se as pessoas ainda preferem o automóvel", diz Wilson.
A queda na demanda, aliada a fatores como a ampliação do uso de biocombustíveis, fez com que o setor, segundo ele, reduzisse a emissão de CO2 em 52% em dez anos.
Para reverter a perda de passageiros, aponta Isaque Ouverney, gerente de Infraestrutura da FIRJAN, é preciso repensar o desenvolvimento das cidades como um todo. "Não há como pensar em mobilidade sustentável sem pensar na necessidade da alteração da lógica do deslocamento", acredita.
Ele exemplifica: "Se uma pessoa mora em Campo Grande e trabalha no Centro, leva duas horas para chegar, então acaba fazendo escolhas como comprar uma moto, um carro, por exemplo", diz Ouverney. "Transição energética diz respeito à planejar território", conclui.
Em uníssono, Iuri Moura, gerente de Desenvolvimento Urbano do Instituto de Políticas de Transporte e Desenvolvimento (ITDP) Brasil, defendeu a reorientação do desenvolvimento urbano de forma que se reduza o número de dependentes do transporte individual motorizado. "Não adianta eletrificar o transporte coletivo, se o passageiro não está mais nele", observa.
Entre as soluções apontadas como forma de atrair novamente o cidadão comum para os ônibus, cita a melhora da qualidade do serviço e ampliação da oferta.
Novos combustíveis
É consenso entre os participantes do debate a necessidade de se investir em energias renováveis. Para Andrea Souza, da Coppe-UFRJ, o tema da transição energética é urgente para o cumprimento da meta de redução da temperatura global em 1.5 grau, estabelecida pela ONU. "É preciso que a gente se afaste de forma definitiva dos combustíveis fosseis", diz.
Para ela, não existe uma "solução única": "O Brasil tem matriz com participação hídrica, eólica, solar outras renováveis que vêm despontando e o país pode se destacar na liderança dessa transição justa para uma economia verde com transporte público eficiente", acredita. O Bio Gás, para Wilson, da Semove, precisa ser mais explorado pelo país. "Com o potencial que temos, daria para substituir 70% do diesel usado", garante ele.